terça-feira, 27 de setembro de 2011

Uma reflexão sobre o comportamento compulsivo - a compulsão alimentar como forma de aprisionamento

Gostaria de compartilhar uma parte de um trabalho que realizei sobre a obesidade mórbida e as implicações psicológicas da cirurgia bariátrica para o Boletim Clínico da Clínica Psicológica "Ana Maria Poppovic" - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Para Roth em Cârência afetiva e alimentação - uma questão delicada, a compulsão não desenvolve-se no vazio, no vácuo, ela inicia-se no relacionamento. Recorre-se à comida quando o indivíduo sente que não é importante para aqueles que ama. Além disto, a compulsão alimentar pode estar relacionada à dificuldade em lidar com os problemas. Para a autora, comprometer-se com uma forma de alimentar-se é o mesmo que comprometer-se em um relacionamento: ambos remetem à uma forma de viver no mundo. O comprometimento significa saber ficar consigo mesmo, antes de relacionar-se com o outro. Neste sentido, o ato de comer pode representar uma metáfora da maneira como vivemos e como nos relacionamos. A comida pode ser para os compulsivos, a forma de serem amados, já que ela está sempre à disposição. A comida não diz não, não magoa e está sempre presente, em todos os momentos de nossa vida. A comida não pode ser considerada o amor, mas neste contexto pode ser a substituição dele.
A obsessão pela comida proporciona um lugar seguro onde o indivíduo pode depositar todos os sentimentos de decepção, raiva e tristeza. Enquanto o indivíduo tiver esta obsessão pela comida, este sempre terá uma razão concreta para explicar a sua dor. Aqueles que comem de forma compulsiva, passarão a sua vida esperando, pois a solução para seus problemas não depende somente do mundo externo ou mais especificamente, da comida, mas também de como o sujeito conseguirá lidar e conviver com suas questões internas.
O problema do comportamento compulsivo é que quando ele termina, o vazio permanece. Portanto, torna-se um ciclo constante, na busca incansável do preenchimento deste vazio através da comida.
Perder a gordura significa deixar a pessoa frente a frente com as feridas que a criaram...
Segundo Yuri em seu artigo o peso na cabeça, é comum após a cirurgia de redução de estômago, o sujeito arrumar um substituto para a sua compulsão, já que não conseguem mais se alimentar de forma compulsiva, ele necessita de outra fonte de prazer. A troca ocorre porque o problema se iniciou muito antes; o obeso mórbido substitui a falta de afeto e a ansiedade pela comida.
Podemos pensar a compulsão como uma forma de aprisionamento, pois o indivíduo compulsivo sempre se deparará com um vazio interior e estará sempre em busca de seu preenchimento, porém busca preenchê-lo de forma inadequada, através da comida. Além disto, o indivíduo compulsivo não consegue libertar-se do prazer que obtém com a comida, já que esta "liberdade" implica também lidar com sentimentos não tão prazeirosos, como suas angústias e conhecer-se mais intimamente. A compulsão dá ao indivíduo a falsa idéia de que seus sentimentos serão amenizados com a ingestão do alimento, fazendo com que ele a utilize sempre que se deparar com dificuldades que não sabe como resolvê-las.
Com a compulsão alimentar o afeto não é superado, muito pelo contrário, esta dificuldade reaparecerá nos momentos de tensão. A compulsão pode ser uma forma de "engolir" a raiva que sente do próprio corpo e de banir o medo do ato afetivo na vida real.


Por Cris Chechetto

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